Dos sistemas políticos apodrecidos

Bárcenas asume la autoría de los papeles y da decenas de documentos contra el PP

Ali ao lado, o cheiro a podre é tanto que o PSOE já corta relações com o PP e tenta negociar uma acção conjunta com a IU, o PNV e a CyU. Bárcenas revela ter pago €25.000 a Rajoy e Cospedal em 2010. Rajoy fala em Estado de Direito para defender-se. Há imagens de SMS trocados entre Rajoy e Bárcenas a correr pela internet.

Já se tem dito que a corrupção não é um desvio da perfeição liberal, uma questão cultural ou uma questão comportamental. Porque não é. Sem isto, o sistema político espanhol não funciona. Sem que existam estas trocas de favores, a economia política espanhola entra em colapso. E quem fala da espanhola também fala da francesa, da italiana, da alemã e da inglesa. Rajoy, Cospedal, Bárcenas e (de outras formas, porque nenhuma coisa desta magnitude parece ter sucedido em Portugal) Passos, Portas, Gaspar, Relvas, Cavaco e Seguro não são mais que excrescências desta economia política que normaliza a venalidade e mercadoriza as relações sociais. E também é por isso que serve de pouco entrarmos por justicialismos, “metam-nos na cadeia, gatunos do caralho”: isso significa, tão-somente, que legitimamos o papel regulador e o aparelho punitivo do Estado neoliberal, em vez de materializarmos a Justiça e a nossa visão colectiva sobre esse conceito hoje tão desprezado.

Talvez seja preciso começar por pegar em Colin Crouch (para não falarmos sempre do senhor barbudo) e falar do postulado primaz da pós-democracia: instituições aparentemente democráticas esvaziadas e ocupadas por interesses corporativos. Em  sociedades de mercado onde estamos a contar as décadas para privatizar o ar, comprar afecto e achar que as desigualdades, bem, as desigualdades até são boas, porque o elitismo não é assim tão mau (e há “esquerda” que acredita nisto) e a pobretagem tem é que se mexer (também há “esquerda” que acredita nisto).

Hoje, na Península Ibérica, interessa pouco saber se vivemos em regimes de protectorado – não o são de facto de jure e recuperar a soberania não passa pelo reconhecimento dessa condição, mas de enfrentá-la. Também não vivemos sob o peso esmagador do fascismo, apesar da tendência autoritária da UE e do actual regime de acumulação capitalista. Mas vivemos em regimes pós-democráticos. Basta fixar Relvas e Bárcenas. E os regimes pós-democráticos não parecem particularmente interessados em renovar contratos sociais, quanto mais em escrever um novo contrato social, favorável aos direitos dos seres humanos e do planeta, que relegue os direitos da propriedade e do capital para quarto plano.

Para isso, precisamos de outra coisa. De escrevê-lo nós.

PS. Por lapso, escrevi de facto e queria escrever de jure. Rasurei.

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3 respostas a Dos sistemas políticos apodrecidos

  1. Um bom conceito, este de “pós-democracia”. Que talvez pudéssemos converter numa noção paradoxal (mas nem por isso menos operatória): a de “democracia pós-democrática”. Ou de como o prefixo “pós”, ainda não há muito tempo usado para qualificar uma modernidade aparentemente esgotada, se revela agora a porta de entrada para novos pesadelos políticos e sociais.

  2. kur diz:

    Atão, e o António Preto- o da mala cheia de ‘papel’?

  3. De diz:

    Independentemente de tudo o resto, que é muito…até que enfim que alguém fala do cheiro nauseabundo que vem de Espanha, saído directamente do ventre “desta economia política que normaliza a venalidade e mercadoriza as relações sociais”

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